A aproximação da posse de Dilma Rousseff trouxe de volta o coro a favor de forte ajuste fiscal.
A alegação dos que defendem essa tese é a de que a política fiscal do governo Lula colocou em risco as contas públicas e pressionou a inflação, ou que o aumento substancial do superavit primário implicará forte queda da dívida e dos juros.
Vejamos esses pontos. Primeiro, a situação fiscal é aceitável, bem melhor do que em períodos anteriores, e a inflação pouco acima do centro da meta não parece estar associada à expansão da demanda provocada por excesso de gasto público. Além disso, a dívida pública líquida (41% do PIB) é uma das menores em relação à dos principais países do mundo.
Segundo, a queda acelerada da dívida pública, com o aumento do superavit primário, pode ter efeito positivo na taxa de juros, mas não se deve esperar baixa expressiva enquanto não houver a separação entre o sistema monetário e o de dívida pública. O atual patamar de taxa de juros está atrelado à forma "sui generis" de convivência desses dois mercados.
O problema se arrasta desde o período de alta inflação e, caso não seja eliminado por meio de reformas envolvendo alterações na remuneração da poupança e o provável abandono dos títulos indexados à Selic, dificilmente a taxa de juros cairá além do nível alcançado no período crítico da crise mundial, e as dificuldades de alongar os prazos de financiamento continuarão a existir.
O principal alvo da crítica, na verdade, não aparece de modo explícito. O que de fato se questiona é a decisão do governo Lula de alterar a lógica da política fiscal e a estratégia de desenvolvimento.
O retorno do Estado como ator central na articulação de novas frentes de investimento levou à reestruturação dos instrumentos fiscais e financeiros de apoio à ação do setor público, exigindo o fortalecimento dos bancos de crédito oficiais, o revigoramento das empresas públicas e a ampliação dos incentivos fiscais.
A candidata Dilma apresentou proposta de governo semelhante.
Espera-se que mantenha a posição ativa do Estado e ainda trate de recuperar a força do planejamento e da política industrial. Um ajuste fiscal severo vai contra essas ideias e coloca em risco a continuidade do programa de investimentos.
Mas, por outro lado, é importante que a manutenção do projeto vencedor das eleições não signifique descontrole das contas públicas. Não há esse risco. A provável redução do ritmo de reajustes do salário mínimo trará reflexos positivos no resultado da previdência social, e outros gastos devem seguir o mesmo caminho.
Além disso, a nova equipe econômica já se comprometeu com a estabilidade fiscal e com a redução da dívida pública, mantendo nível adequado de superavit primário.
O valor proposto para o saldo primário (3,1% do PIB) e um crescimento médio da ordem de 5% do PIB garantem a redução sustentada do peso da dívida pública no decorrer do próximo mandato presidencial, sobretudo se vier a ocorrer reforma capaz de dar fim ao entrelaçamento entre mercado monetário e de dívida pública, abrindo espaço para a queda da taxa de juros.
Enfim, o momento da economia brasileira é favorável e não requer a adoção de rígido programa de austeridade fiscal; basta levar adiante a política de defesa do crescimento e sustentar o compromisso de não deteriorar as contas públicas em nome da expansão econômica
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Postado por Saul Leblon às 04:44
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